
Naquele tempo era fácil ver
sorrisos por todos os cantos. Quando se tem dezoito anos tudo e todos se
tornam motivos de alegrias. Aquela altura todo mundo já tinha formado
suas turminhas. Aqueles grupinhos onde os assuntos mais comentados eram
músicas, roupas e é claro, mulheres. Sempre mulheres. Cada grupo se
sentia mais exclusivo com todos os seus membros reunidos. É como se
fosse uma competição de vitrines que vendiam aparências, onde vencia
aquela que mais mostrava felicidade e que mais tivesse pessoas felizes.
Ou pelo menos aparentando estar felizes. Como se aquele amontoado de
adolescentes com hormônios à flor da pele fossem ligados por um só
objetivo: o de aparentar algo que não estavam sentindo. A grande maioria
era assim. Com exceção de Rosa. Isso sim é que era mulher.
Independente, autodidata, cativante, comunicativa, controlada e popular.
Todas as características de uma fêmea dominante, que apesar de toda sua
desenvoltura era somente uma menininha de dezoito anos que simplesmente
era impecável em tudo que fazia. Falava bem, bebia e fumava como
ninguém, tirava dez em todas as lições e ainda era descolada. O melhor
dos dois grupos, o dos nerds e o dos vagabundos, e de todos os outros
estava ali. Tudo isso reunidos em perfeitos um metro e sessenta e cinco e
distribuídos em adoráveis e bem colocados setenta e um quilos. Certa
vez tive a sorte de ir embora com ela de ônibus e mais sorte ainda dela
sentar ao meu lado. Não poderia deixar passar tal oportunidade e tentei
uma aproximação amigável, mas muito idiota – coisa bem típica minha
mesmo. Que horas são por favor? – perguntei a ela que além de ter nome
de flor, também cheirava como uma. São duas horas, mas vem cá você não
está de relógio? – disse ela com uma visível vontade de rir. Pronto. Lá
estávamos rindo escancaradamente dentro do ônibus de um péssimo jeito de
se chegar em alguém. Após isso e diversas conversas sobre diversas
coisas diversas começamos a falar sobre ela. Rosa, como você consegue
sempre ser tão feliz e amável com tudo e todos? Olha, disse ela já
transparecendo uma outra feição, se você soubesse o quanto é triste ser
eu não diria isso. Todo dia acordo querendo ser a melhor pessoa do
mundo, mas ao me levantar e me olhar no espelho só consigo ser o que os
outros querem que eu seja… só me arrumo assim porque minha mãe quer, só
bebo e fumo desse jeito porque meus amigos querem e só sou assim para
agradar a tudo e a todos. Na verdade sou mais triste e sozinha que as
meninas mais tristes e sozinhas da nossa escola. Mas tem nada não.
Permaneço assim só para poder não ser só. Só para alguém me amar um
pouquinho. Que não seja real mas que seja amor. Falso ou verdadeiro eu
preciso e vivo desse amor. Bem, tenho que ir. A minha casa é no próximo
ponto. Foi bom conversar contigo. Pelo menos pude ser eu mesma uma vez
na vida. A gente se encontra por aí. E saiu descendo as escadas daquele
ônibus como se fosse uma porta de saída de um confessionário onde se
haviam expulsado todos os seus demônios. Lá se foi também a alma mais
pura e inocente que eu conheci, presa dentro de um corpo que não era
dela. Era de tudo e de todos. Uma vida que apesar de ser tão cheia era
vazia. E esse vazio me deu pena. Pena por achar aquilo tudo tão vazio. E
por nunca ter percebido que a menina mais legal da minha escola era
mais artificial que uma rosa de plástico. Seu nome até era o da mais
linda flor mas o resto continuou sendo de tudo e de todos. Menos dela
mesma. E o mais engraçado é que mesmo após todos esses anos continuo
conhecendo novas Rosas. Novas velhas vidas sem vida. E colocando mais
espinhos nessa interminável e enorme coroa de aparências. Uma aparência
que pode até ser bela, mas só quem vê por dentro dela discorda de toda
essa beleza. Pobre Rosa de plástico…
Eduardo Orlando Holopainen
Eduardo Orlando Holopainen
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